sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O julgamento de Deus será mais tolerante para com os ateus do que para com os criacionistas?

Pergunta feita à William Lane Craig, logo abaixo a resposta.

Dr. Craig,

Eu gostaria de saber de você se eu, como um ateu, serei julgado por Deus por não acreditar nEle. Se eu, após buscar objetivamente por toda a evidência, chegar à conclusão que não cheguei aqui como resultado de um plano divino, mas simplesmente como consequência de processos físicos, ainda assim merecerei ser privado do dom da vida eterna? Se quando ver Deus face a face após a morte, eu disser que essa foi uma posição que eu honestamente cheguei depois de muita investigação e de realmente tentar compreender a natureza?

Eu realmente não consigo ver como Deus me puniria, se eu viver uma vida boa, honesta e compassiva, mas apenas sentir que essa é a única posição que faz sentido no mundo à minha volta e o que eu entendo sobre ele. Para mim isso não parece digno de condenação, quando comparo minha atitude aos padrões de evidência e investigação à de alguns cristãos, especialmente aqueles que mantêm posições dogmáticas extremamente irracionais. Se eu aceitar as descobertas da ciência, Deus me punirá, mas recompensará aqueles que rejeitam toda a evidência científica e aderem apenas a posições cientificamente insustentáveis, como uma interpretação literal de Gênesis, onde todo o universo foi criado entre seis e dez mil anos atrás?

Eu acrescentaria a isso ao dizer que muitos do que defendem esta posição, chamados de criacionistas da Terra Jovem, disseminam completas mentiras e desinformações e tudo mais, seja na astronomia à geologia e biologia, qualquer campo científico que não apóie sua leitura do que eles consideram como escritura divinamente inspirada. Isso tirando o fato que quase todos eles são completamente desqualificados para falar das áreas que falam; se alguém não possui um doutorado em paleontologia e não é um membro ativo da comunidade paleontológica, então na verdade não tem direito nenhum de falar sobre o estado do registro fóssil em público a uma audiência que é igualmente desqualificada para avaliar a veracidade das afirmações que são feitas. No entanto eu respeito a autoridade das pessoas que trabalham nas áreas; quando eu li Evolution: What the Fossils Say and Why It Matters [Evolução: O que Os Fósseis Dizem e Porquê Importam] de Donald Prothero, eu respeito as visões dele sobre o registro fóssil já que ele trabalha na área há trinta anos e examinou pessoalmente muitos dos fósseis que ele fala. Da mesma forma, quando Sean Carroll explica como a evidência do DNA apóia a evolução em The Making of the Fittest [A Criação dos Mais Adaptados], eu respeito a opinião dele já que ele está linha de frente da biologia moderna.

Na verdade, quando eu leio livros sobre história bíblica e comparo a evidência para a evolução biológica, segundo os cientistas de hoje, com a evidência para um evento histórico como o Êxodo, segundo os arqueólogos e historiadores de hoje, então vejo que é óbvio que há um padrão duplo sendo mostrado por alguns cristãos, considerando o respeito pelas evidências e pela autoridade das pessoas que sabem do que estão falando. Eu tenho certeza que muito mais cristãos aceitariam o Êxodo como um evento histórico do que aceitariam a ocorrência da evolução biológica.

Eu realmente não vejo por que essas pessoas que mantêm crenças irracionais e inflexíveis merecem ser recompensadas por seu aparente anti-intelectualismo e relutância em examinar criticamente as evidências e aplicar níveis apropriados de pesquisa a vários assuntos. Deus realmente vai recompensar aqueles que continuam a divulgar absurdos, mesmo quando cientistas apontam seus erros, e restringem a educação de crianças? Pessoas como Ken Ham constroem museus para mostrar às crianças como os dinossauros viverem com os homens e todos os “tipos”, os quais, seja lá como é definido, abrangem uma quantidade enorme de animais, que de alguma forma foram amontoados num barco. Isso é impossível por inúmeras razões, mas mesmo assim continua sendo ensinado a criancinhas. Ele também ‘ensina’ as crianças a perguntarem ao professor de ciências a seguinte pergunta altamente imbecil: ‘Você estava lá?’ Como se a pesquisa e investigação científicas empreendidas pelo homem não tivessem a menor chance de competir com a “verdade revelada”.

As atitudes dessas pessoas aumentam ainda mais a indisposição de minha parte de me associar com eles em qualquer sentido, e apenas reforça minha convicção que eles merecem condenação eterna muito mais do que eu.

Grato,
Adam.

Dr. William Lane Craig responde:

Existem algumas questões diferentes na sua pergunta, Adam, que ficaram embaralhadas e precisam ser separadas para que eu possa respondê-las claramente. Por favor, seja paciente comigo, e preste atenção enquanto tento lidar com suas preocupações que são claramente profundas.

A primeira e principal pergunta é: baseado em que Deus julgará as pessoas? Enquanto lia sua pergunta, Adam, eu pensei, “Ele não compreende a doutrina cristã da salvação!” Você pode ficar surpreso ao saber que a maioria dos criacionistas da Terra Jovem CONCORDARIAM com você que eles merecem a condenação eterna, na mesma proporção, se não mais que você. Como pode ser? Porque no centro da doutrina cristã da salvação está a imerecida Graça de Deus.

Esse ensinamento é obscurecido hoje por um tipo de cristianismo cultural que tem moldado a cultura americana. O cristianismo cultural ensina que se suas boas ações superarem suas más ações, então Deus perdoará suas más ações e lhe recompensará com a vida eterna no céu. (Como Jesus Cristo se encaixa nesse quadro não está claro – talvez como uma ilustração viva de como Deus é). Ao contrário disso, o cristianismo bíblico ensina que ninguém é bom o bastante para ir ao céu. Ser julgado baseado em nossas ações seria a pior coisa possível que poderia nos acontecer, pois nenhum de nós é aceitável perante a lei moral de Deus (perfeição). O filósofo Immanuel Kant disse corretamente que levaria uma infinidade de tempo para o homem alinhar perfeitamente sua vontade com o padrão moral de Deus – e, então, mesmo se de alguma forma conseguisse, ele continuaria culpado pelos resíduos infinitos de pecado que cometeu até ali.

Portanto, nós precisamos desesperadamente de um Salvador, alguém que nos livre da terrível condição moral em que nos encontramos. Jesus é a provisão de Deus para nosso pecado. Ele foi chamado de o Cordeiro de Deus, não porque ele era dócil e meigo, mas porque ofereceu Sua vida a Deus como um sacrifício por nós. Ele morreu em nosso lugar, carregando a punição por nossas iniquidades e maldades, e assim satisfez as exigências da lei moral de Deus e liberou o perdão de Deus a nós.

Por isso, a salvação só pode ser obtida como um presente da Graça de Deus; não há nada que possamos fazer para obtê-la. É por isso que a linguagem de “recompensa” é totalmente inapropriada em relação à salvação. Você está absolutamente correto que os criacionistas não “merecem ser recompensados por seu aparente anti-intelectualismo” ou por qualquer outra coisa, nessa questão. Se eles são salvos, é apenas porque eles aceitaram humildemente e em contrição o dom da Graça de Deus, sem mérito ou esforço.

Agora o que acontece com você se você rejeitar a Graça de Deus? Você volta à Sua Justiça. Você realmente acha que você é aceitável? Quando diz, “Eu realmente não consigo ver como Deus me puniria, se eu viver uma vida boa, honesta e compassiva,” o problema é com este “se”. Adam, acorde! Quanta compaixão você sentiu quando escreveu essa última frase de sua carta? Eu me lembro quando não era cristão e ouvi o Evangelho pela primeira vez. Eu vivia uma boa vida, moralmente correta – externamente ao menos, e ainda assim descobri que, segundo a Bíblia, eu era culpado diante de Deus e por isso estava indo direto para o inferno, eu não tinha nenhum problema em acreditar nisso. Quando eu olhei dentro do meu coração, eu vi as trevas lá dentro, como tudo que fiz era manchado pelo egoísmo. Eu soube quão miserável eu realmente era.

Eu suspeito que muitas pessoas hoje não sentem sua necessidade de um Salvador porque elas têm crescido tão moralmente satisfeitas que nem mesmo percebem quão moralmente caídas são. C. S. Lewis uma vez observou que você nunca sabe quão mal está até que tenha verdadeiramente tentado ser bom. Assim que você tentar, séria e constantemente, então perceberá quão rápido você cai. É por isso que o filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard, em sua profunda análise da condição humana, viu que a vida ética, buscada com seriedade, acaba levando à culpa e desespero e deve ser transcendida pelo nível espiritual no qual a Graça de Deus é descoberta.

Então esqueça os criacionistas da Terra Jovem, Adam! Por que deixá-los ficar entre você e Deus? Por que não receber a Graça transformadora de Deus e então ser melhor do que eles? Você sabe que eu não tenho as visões deles sobre a idade do universo. E nem a maioria dos cristãos evangélicos, apesar da grande presença de seu movimento nas igrejas. Então por que não se tornar um cristão e assim ser um pensador melhor do que eles? (Na verdade, você pode justamente descobrir que Deus fará uma obra transformadora em seu coração, substituindo o que parece ser ódio e ressentimento a essas pessoas por uma compaixão genuína por elas.)

Isso leva à segunda pergunta, que está apegada à primeira: Deus me condenará por minha descrença se eu, após buscar objetivamente por toda a evidência, chegar à conclusão que não cheguei aqui como resultado de um plano divino, mas simplesmente como consequência de processos físicos?

Essa é uma pergunta estranha, já que o que você está perguntando é, em efeito: serei condenado por Deus baseado em um argumento ruim? Pois seu motivo para rejeitar Deus é realmente um argumento ruim. Você parece pensar que a crença na teoria da evolução é incompatível com a crença em Deus. (Apenas ocorreu-me, Adam, que você está na verdade muito mais perto das visões dos criacionistas da Terra jovem do que você pensa! Que ironia!) Mas não há nada sobre a teoria da evolução que implica ateísmo. (Veja o meu artigo “Naturalismo e Design Inteligente,” em Intelligent Design, Ed. R. Stewart [Minneapolis: Fortress Press, 2007], pp. 58-71.) Suponha que o plano divino seja que você tenha chegado aqui através do processo evolucionário? Então como a evidência científica para a evolução da vida faria algo para provar que isso não foi o resultado do plano de Deus? Sua dificuldade não é que você tem boas objeções contra o teísmo, Adam, mas que você não está pensando tão profundamente sobre essas questões.

Ainda assim a pergunta permanece, suponha que eu falhe em acreditar em Deus, porque fui enganado por um argumento ruim. Deus me condenará? A pergunta que você na verdade está colocando aqui é se existe algo como uma descrença inculpável.

Eu vejo que, em última análise, não existe essa coisa de descrença inculpável. Pois, primeiro, existem boas evidências para o teísmo que são de fácil acesso a todos, como as que eu compartilho em “A Veracidade da Fé Cristã” [Editora Vida Nova], e não há nenhum bom argumento à altura para o ateísmo. Eu convido você a ouvir a algum de meus debates com ateus influentes e apenas se pergunte objetivamente: para que lado a evidência aponta? Segundo e mais importante, Deus não nos abandonou para descobrir com a nossa própria genialidade e inteligência se Ele existe ou não. Antes, Seu Espírito Santo fala ao coração de todo homem, convencendo-o do pecado e levando-o até Deus. Se nossos corações estão dispostos a buscar a Deus, então nós O encontraremos. Isso pode levar tempo. É por isso que eu disse que em última análise a descrença é culpável. Quando uma pessoa chega à hora da morte, ela terá tido oportunidades suficientes para responder ao Espírito de Deus e ser salva. O fato de Deus lhe ter trazido até este site para ter sua pergunta respondida e, espero, esclarecida, é um passo nesse processo. A pergunta agora é, onde está seu coração? Você quer conhecer a Deus se Ele existir? Que passos concretos você está tomando para buscá-Lo?

Fonte(traduzida): Apologia

Nota: "Criacionistas da terra jovem" são os criacionistas, pricipalmente adventistas, que afirmam que cientificamente a terra não tem mais do que 15.000 anos.


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