Quando preparava uma palestra sobre
consumismopara o 7º Simpósio Universitário do Unasp (outubro de 2009), li, entre outros, o interessante e instrutivo livro
A Lógica do Consumo, de Martin Lindstrom (Editora Nova Fronteira). Lindstrom é diretor-executivo e presidente da Lindstrom Company. Como um dos mais respeitados gurus do
marketingmundial, presta consultoria a executivos de alta patente de empresas como a McDonald’s Corporation, Nestlé, Nokia, Microsoft e GlaxoSmithKline. Lindstrom já escreveu para inúmeras publicações, incluindo
USA Today,
Fortunee
Washington Post. Seu livro anterior,
BrandSense, foi considerado pelo
Wall Street Journal um dos dez melhores livros de
marketing já publicados. Seus livros sobre
branding foram traduzidos para dezenove línguas, e ele fala para um público global que beira um milhão de espectadores.
Em A Lógica do Consumo, Lindstrom não se vale apenas de seu extenso e respeitável currículo para tratar do assunto. Ele apela também para a neurociência: a mais recente tecnologia de varredura do cérebro foi usada em cerca de dois mil voluntários de todo o mundo para desvendar suas reações aos mais diversos estímulos visuais. E as descobertas foram surpreendentes. Por exemplo: a insinuação do sexo nas propagandas não ajuda a promover uma marca, simplesmente porque o sexo só promove a si mesmo; muitas vezes, a publicidade de uma marca assume características típicas dos rituais religiosos, estabelecendo rotinas e garantindo a fidelidade de seu consumidor; apesar de toda polêmica, a propaganda subliminar está em toda parte. E este tópico, em especial, chamou minha atenção.
No capítulo “Não consigo mais ver com clareza – mensagens subliminares, vivas e fortes”, Lindstrom desmitifica histórias como a da experiência de James Vicary, de 1957, segundo o qual, com a inserção, no meio de um filme, de fotogramas com as palavras “Beba Coca-Cola”, teria sido possível levar o público a consumir mais do refrigerante. Anos depois, o próprio Vicary, que cunhou a expressão “propaganda subliminar”, admitiu à revistaAdvertising Age que a experiência de 1957 havia sido um truque – ele tinha inventado tudo. Isso significa que não existem mensagens subliminares? Não, significa apenas que não devemos sair por aí procurando chifre em cabeça de cavalo. E é exatamente isto o que Lindstrom faz: dá nome aos bois, estes, sim, portadores de chifres.
O consultor menciona, por exemplo, o clássico anúncio nas páginas amarelas de uma empresa inglesa de pavimentação chamada D.J. Flooring, cujo slogan é “Laid by the Best” (um trocadilho com a palavra laid que, na língua inglesa, tem o duplo significado de assentar a pavimentação e levar alguém para a cama). Na posição vertical, o anúncio mostra a imagem de uma mulher segurando uma taça de champanhe, mas, se a imagem for colocada de ponta-cabeça, surge uma mulher tocando as partes íntimas.
Segundo Lindstrom, nem todas as mensagens subliminares são tão sutis. “Hoje, algumas lojas tocam gravações de jazz ou música latina (disponíveis em mais de um site na internet) com mensagens ocultas – imperceptíveis para nossa mente consciente – visando a incitar os compradores a gastar mais ou desestimular furtos nas lojas. Dentre as mensagens estão: ‘Não se preocupe com o dinheiro’, ‘Imagine que você tem um assim’ e ‘Não roube, você será pego’. Segundo um fornecedor, o faturamento total das lojas que tocam essas gravações subiu 15%, ao passo que os furtos diminuíram 58%” (p. 70).
Lindstrom afirma que a publicidade subliminar (que na definição dele são mensagens subconscientes transmitidas pelos publicitários em uma tentativa de nos atrair para um produto) é muito mais predominante do que as pessoas imaginam.
Antes de se debruçar sobre os dados da pesquisa de rastreamento cerebral, o autor cita ainda a publicidade subliminar usada em campanhas políticas, como o famoso caso do anúncio produzido em 2000 pela Comissão Republicana Nacional, no qual George W. Bush critica o plano de medicamentos de Al Gore para os idosos. O slogan: “The Gore prescription plan: bureaucrats decide” [“O plano de medicamentos de Gore: os burocratas decidem”]. Depois, no fim do anúncio, a palavra rats (“ratos”, parte da palavra inglesa bureaucrats) aparece rapidamente em letras grandes por uma fração de segundo, enquanto uma voz em off reitera a frase: “Bureaucrats decide.” O criador do anúncio, Alex Castellanos, confessou depois que a palavra rats era um “alerta projetado para fazer você olhar para a palavra bureaucrats”.
“Claramente, a publicidade subliminar permeia muitos aspectos da nossa cultura e nos acomete diariamente. Mas será que exerce realmente alguma influência sobre nosso comportamento ou, como a maioria dos casos demerchandising, é basicamente ignorada por nosso cérebro?”, pergunta Lindstrom. Vamos aos fatos.
Em 1999, pesquisadores da Universidade Harvard testaram o poder das sugestões subliminares em 47 pessoas. Lidstrom descreve o experimento que consistiu no uso de um jogo de computador que exibia palavras de cunho positivo e negativo. Resultado: o comportamento dessas pessoas foi afetado.
“Recentemente, dois pesquisadores demonstraram que uma breve exposição a imagens de rostos sorridentes ou zangados durante 16 milissegundos – tempo insuficiente para que os voluntários registrassem conscientemente a imagem ou identificassem a emoção – afetou a quantidade de dinheiro que os participantes do estudo estavam dispostos a pagar por uma bebida. [...] Os pesquisadores chamaram esse efeito de ‘emoção inconsciente’, o que significa que uma pequena mudança emocional havia acontecido sem que os participantes tivessem conhecimento do estímulo que a havia causado ou de qualquer mudança em seu estado emocional. Em outras palavras, rostos sorridentes podem nos fazer subconscientemente comprar mais coisas, o que sugere que os gerentes de lojas que instruem os funcionários a sorrir estão no caminho certo” (p. 72).
Em 2005, um estudante de pós-doutorado da Universidade da Pensilvânia chamado Sean Polyn usou um IRMF [aparelho de Imagem de Ressonância Magnética Funcional] para estudar como o cérebro procura lembranças específicas. Polyn e sua equipe descobriram evidências de que as pessoas são capazes de recuperar mentalmente imagens e categorias antes mesmo de lembrar do nome da imagem, o que sugere que o cérebro humano é capaz de recuperar imagens antes que elas fiquem registradas na consciência.
Mas essa capacidade de resgate de informações abaixo do nível de consciência é capaz de moldar o comportamento? Foi exatamente isso que Lindstrom se propôs descobrir, com a ajuda da Dra. Gemma Calvert, catedrática de Neuroimagem Aplicada da Universidade de Warwick, Inglaterra, e fundadora da Neurosense, em Oxford. Usando também um moderno IRMF, Lindstrom estudou um grupo de 20 fumantes do Reino Unido. Os detalhes da pesquisa estão no livro, mas o resultado é conclusivo: sim, as mensagens da propaganda subliminar são ainda mais eficazes que as da propaganda explícita. Isso porque as imagens subliminares geram mais atividade no córtex visual primário – como era de se esperar, por causa da tarefa visual mais complexa de processamento daquelas imagens. “Ao comparar as reações cerebrais aos dois tipos diferentes de imagens, a Dra. Calvert descobriu mais atividade nos centros de recompensa e desejo quando os participantes viam imagens subliminares do que quando viam imagens explícitas” (p. 78).
O guru do marketing conclui, respondendo à pergunta: “A publicidade subliminar funciona?” “Sim, assustadoramente bem.” Por quê? Porque os consumidores submetidos a ela não reagem conscientemente e, portanto, “abaixam a guarda”. Fica, então, o alerta de Lindstrom: “Muitas empresas, como a Abercrombie & Fitch e a Ralph Lauren, e [...] a Philip Morris, já começaram a usar publicidade sem logomarcas, e com ótimos resultados. No futuro, muitas marcas vão fazer o mesmo. Portanto, lembre-se: as mensagens subliminares estão por aí. Não caia – nem deixe que sua carteira caia – nas garras delas” (p. 81).
Depois de ler o livro, consultei o amigo Cristiano James Kleinert, designer graduado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que estudou semiótica da imagem, psicodinâmica das cores, gestalt, psicologia da comunicação, história da arte, ergonomia cognitiva e várias outras disciplinas na área neurossensorial. No fim do curso, ele estudou também Novas Tecnologias, em nível de mestrado, ficando às voltas com autores como Pierre Levy, Negroponte e outros. Ele cita um exemplo interessante:
“Atuei por cinco anos em desenvolvimento de embalagens e displays, com clientes como Elma Chips, Natura, Perdigão, Dell, Siemens, Tramontina, etc., e tais mídias são o último apelo de venda ao consumidor (e entre algumas empresas, o único). Um exemplo clássico de apetit appeal: praticamente todas as embalagens de alimentos têm a foto do produto (pronto, saindo até fumacinha) no mesmo ângulo em que o consumidor vê tal produto sobre a mesa, no momento da refeição. Quando o consumidor passa pela gôndola, tal estímulo visual vai acionar sua memória (mesmo alimento, ângulo, etc.), mecanismo de recompensa, centro do prazer, etc., ou seja, não é algo consciente, portanto, é subliminar. Minha profissão vive disso.”
Outra fonte consultada foi
Hélio Pothin, doutor em Fisiologia e professor na UFSM. Ele ajuda a ponderar o assunto de uma perspectiva espiritual: “Somos influenciados por muitas informações sensoriais a todo momento. A maioria dessas informações não é processada conscientemente, ou seja, não fica à disposição dos pensamentos com os quais formulamos nossas ideias e comportamentos habituais. Porém, isso não significa que não foram processadas em algum local do sistema nervoso e que, possivelmente, possam ser utilizadas em algum momento ou de alguma forma que ainda não entendemos. Consciência é um conceito muito discutível e não é fácil de ser entendido ou mesmo explicado. Essas informações são classificadas em diversos níveis: subentendidas, subjetivas, subliminares, escondidas, minimizadas, obscuras, etc. Não tenho dúvidas de que sofremos influências por meio desse tipo de informações, pois Satanás influencia os seres humanos de maneira palpável, porém, não explicável. O Espírito Santo influencia as pessoas de forma não conhecida ou não explicável, mas através da consciência, ou seja, de locais reais ou virtuais do sistema nervoso. Portanto, mensagens subliminares – ou qualquer outro nome que se queira usar – são relatadas, vistas e ouvidas em vários estudos e experiências. Acreditar ou não depende da compreensão de cada um.”
A expressão “acautelai-vos” aparece 13 vezes no Novo Testamento (na versão Almeida Revista e Atualizada). Mas como podemos ter cautela com respeito a mensagens subliminares? Para mim, Romanos 12:2 é uma boa resposta: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” A mente constantemente transformada pela comunhão com Deus e Sua Palavra edifica “firewalls” espirituais capazes de nos proteger das más influências – sejam explícitas ou não.